quinta-feira, 9 de maio de 2013

Resolução da Hipótese Prática 4



Antes de mais, nos termos do art. 120º CPA considera-se o despacho do presidente da câmara como acto administrativo.
Trata-se de seguida na análise da sua invalidade com base na análise dos argumentos utilizados por António.

Questões de competência
Tratando-se da cedência de uma licença para instalação de fábricas de produtos tóxicos, a competência é da Câmara Municipal, nos termos da alínea a), do nº5, do art. 68º da LAL. Não cabendo portanto no leque de competências do Presidente da Câmara.
Deste modo, pode afirmar-se que sofre este acto de um vício de competência, resta saber qual a sanção a aplicar. À primeira vista parece tratar-se de usurpação de poderes, mas, visto que não é um vício grave por não por em causa o princípio da separação de porderes, trata-se de um mero vício de incompetência relativa e não absoluta. Existe falta de competência por parte de órgãos com atribuições comuns, o Presidente da Câmara pratica um acto da competência da Câmara Municipal.
Pelo exposto, a sanção a aplicar não se enquadra no âmbito do art. 133º CPA (nulidade) que, embora não taxativo e sendo uma cláusula aberta, é mais grave e não parece razoável, mas sim no âmbito do art. 135º CPA - anulabilidade.
 

Questões formais
A regra geral de forma do acto administrativo é a de que devem de revestir forma expressa, no entanto esta pode ser por simples exteriorização da vontade do órgão da Administração não exigindo a adopção de um modelo especial ou poderá ser mais solene, ou seja, têm de obedecer a um certo modelo legalmente estabelecido – art. 122º CPA.
Este artigo apenas estatui que deveram os actos revestir de forma escrita, não sendo no entanto obrigatório, salvo as situações no nº2. MAS a questão aqui não será essa porque o despacho é um documento escrito. Não existe no CPA nenhuma disposição que em concreto se refira à forma que deve adoptar um acto pelo que, a menos que exista um diploma legal que consagre uma forma mais solene que um despacho para a cedência de uma licença, a forma parece apropriada.



Questões procedimentais
António invoca que foi praticada uma invalidade, ao não ter existido uma audiência prévia.
Na realidade a audiência dos interessados é um direito dos particulares e trata-se de um direito fundamental consagrado na Lei Fundamental. Encontra-se estatuída nos art. 267º, nº1 CRP e nos arts. 100º e seguintes CPA.
O art. 100º estabelece uma obrigatoriedade de audiência de interessados, salvo o disposto no art. 103, que estabelece casos de inexistência e dispensa deste direito. Não corresponde este caso a nenhuma das excepções pelo que não sendo possível dispensar esta fase à uma violação grave de um direito dos particulares sendo por isso a sanção da nulidade a aplicar ao caso, com base na alínea d), do nº2, do art. 133º do CPA.
Outro dos argumentos do António é a de que existia um “deferimento tácito”. Há que atender ao disposto no art. 108º CPA. O referido artigo prevê a hipótese de deferimento tácito quando a decisão não é estabelecida no prazo definido por lei. No caso em análise não há nenhum prazo definido em lei especial, pelo que se segue o disposto no nº2 do artigo 108º CPA – estabelece-se um prazo de 90 dias. O assunto em relevo entra na previsão da alínea a) do nº3 do artigo, assim pode esta licença ser passível de deferimento tácito.


Questões materiais
No que concerne às questões materiais, vários problemas são suscitados nos argumentos de António.
Primeiramente, alega a existência de um “erro manifesto” na decisão. Decorre este argumento do facto de a justificação do indeferimento do pedido se relacionar com a não justificação para o desenvolvimento do município, bem como, de acordo com o Presidente da Câmara, com a não criação de postos de trabalho. Ora parece difícil crer que uma fabrica não venha a criar postos de trabalho, pelo que, havendo este erro, o acto sofre de um vício material, devendo por isso considerar-se anulável. Não se considera nulo pois não é suficientemente grave para tal, mesmo que haja erro, não é impeditivo que a solução seja a mesma com base noutras circunstâncias.
São ainda invocados por António, um vício de desvio de poder e outro de violação de lei.
Relativamente ao primeiro, era um poder típico do poder discricionário, de natureza material, consistindo no desrespeito de um fim legal, que tanto pode acontecer quando seja prosseguido um fim de interesse privado (corrupção) ou um fim de interesse público, há uma substituição desse fim de interesse legal, por um fim de interesse não legal. Nada indica que possa haver um desvio de poder, a norma de competência da Câmara Municipal tem como fim legal a conjugação dos diversos direitos em causa que são conflituantes entre si, nomeadamente o direito à liberdade e autonomia privada e o direito a um ambiente saudável (art. 66º CRP), sendo este um direito internacional que tem como corolários o direito à saúde, ambiente viável, decente, sustentável, equilibrado e de bem-estar. Pelo exposto, o despacho prossegue o fim legal da norma, não havendo razões para se defender um desvio de poderes.
Quanto ao segundo vício, de violação da lei, este tem também uma natureza material, todavia trata-se de um desrespeito de regras relativas ao conteúdo/objecto de determinado acto, quer seja do poder discricionário quer do poder vinculado. O CPA, no seu art. 3º estabelece um princípio de legalidade, este deve de ser interpretado e entendido num sentido amplo embarcando todos os vícios da ordem jurídica no seu todo, inclui todos os outros vícios anteriormente tratados no caso.
Por último, António alega ainda a violação do princípio da igualdade e da imparcialidade. Ambos estão previstos no CPA, nos arts. 5º e 6º respectivamente. Feita uma apreciação ao caso no seu todo, torna-se difícil encontrar dados que permitam concordar com o argumento de António.

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