Modelo
Administrativo Anglo-Saxónico
Até aos séculos XVII e XVIII vigorava na Europa o
sistema tradicional que se caracterizava pela inexistência de separação de
poderes e inexistência de um Estado de Direito. Ou seja, as funções
administrativa e judicial misturavam-se. O Rei era simultaneamente o supremo
administrativo e supremo juiz, sendo que não havia subordinação da
Administração Pública ao princípio da legalidade, e por isso não havia normas
que a regulassem nem que conferissem direitos aos particulares face a esta.
O Direito anglo-saxónico teve uma lenta formação ao
longo dos séculos, existindo sempre um papel destacado do costume. Embora
vinculados à regra do precedente, é de referir a grande independência dos
juízes e prestígio do poder judicial.
O sistema anglo-saxónico surgiu como um forte
opositor a este modelo administrativo, e surgiu com a Grande Revolução em
Inglaterra, em 1688, que foi um dos eventos mais importantes na evolução dos
poderes do Parlamento do Reino Unido e da Coroa Britânica.
Este modelo caracterizou-se então por uma verdadeira
separação de poderes, onde o Rei, devido à abolição da Star Chamber, em 1641, se viu impossibilitado de resolver questões
de natureza contenciosa. A Star Chamber
consistia num Tribunal Britânico em que se julgavam as pessoas de mais alto
nível que nunca conseguiriam ser acusados nos tribunais comuns, sendo que as
sessões eram feitas em segredo, e sem testemunhas. Era pois um tribunal
controlado pelo monarca, que com cuja abolição ficou assim impedido de dar
ordens aos juízes, transferi-los ou demiti-los. Tal deveu-se também à criação
do Act of Settlement, em 1701, graças
ao qual os juízes ganharam grande independência face ao Rei.
A Bill of
Rights, em 1689, veio estabelecer os direitos, liberdades e garantias dos
cidadãos britânicos e estipular um verdadeiro reino do direito, rule of law. O Bill of Rights determinou que o Direito comum seria “aplicável a
todos os ingleses – Rei ou súbdito, servidor da coroa ou particular, militar ou
civil, - de qualquer parte da Grã-Bretanha”, ou seja, o Direito estava acima de
qualquer pessoa ou entidade pública ou privada. Portanto, o Rei e Administração
ficaram subordinados ao Direito e sujeitos ao controlo jurisdicional dos
tribunais comuns. Ou seja, tanto o Rei como os seus conselhos e funcionários se
regem pelo mesmo direito que qualquer cidadão anónimo. Esta subordinação
significa que não existem, por via de regra, privilégios ou prerrogativas de
autoridade pública. Daqui decorre que no sistema administrativo de tipo
britânico a Administração Pública não pode executar as decisões por autoridade
própria, através de meios coactivos. Em suma, são conferidos aos Tribunais
Comuns poderes de injunção face à Administração. As decisões unilaterais da
Administração não têm força executória própria, não podendo ser impostas por
coacção sem intervenção judicial. Quer isto dizer que se o particular se
recusar a acatar as suas ordens, aquela terá de se dirigir ao tribunal comum,
por forma a obter uma sentença que torne imperativa a sua decisão.
É ainda de referir que o poder no sistema britânico
era descentralizado, pois as autarquias locais gozavam de ampla autonomia face
a uma intervenção central diminuta.
No sistema britânico os particulares possuíam um
leque de garantias jurídicas contra as ilegalidades e abusos da Administração
Pública, e os tribunais comuns gozam de plena jurisdição face à Administração
Pública, exercendo um papel preponderante.
Existe então uma unicidade de jurisdição que garante
melhor aposição do particular, um direito unitário, e melhor defesa judicial
dos direitos subjectivos. Há então uma maior tendência para o compromisso e
tutela dos particulares.
A mudança sentida na administração traz consigo
métodos mais eficazes de controlo da administração pública. Estes métodos
traduziram-se na criação de instituições chamadas Administrative Tribunals. Estes não eram tribunais mas antes órgãos
especiais que, diversos, procuravam ser autónomos e independentes. Primeiramente
foram-lhes atribuídos poderes de actuação coactiva da Constituição na lógica do
sistema francês, mas vêm a adquirir mais tarde poderes administrativos.
Mais tarde estes Tribunals ganham em muitos casos
poderes de decidir os litítios sem que seja preciso recorrer a um tribunal.
Contudo, a partir dos anos 20 um conjunto de políticas prosseguidas pelo
Governo vem estabelecer que a última palavra deve pertencer a um court. Tinhamos tribunais comuns, depois
os tribunos e depois a necessidade de os refrear. Surge a ideia de que a última
palavra deverá ser a de um court. Visto isto, a Administração começa a ser
prestadora e surgem, ao lado de órgãos dotados de poderes coactivos, órgãos
administrativos que exercem a função jurisdicional.
Na existem hoje verdadeiros Tribunais Administrativos
em Inglaterra. No entanto, o conceito britânico é relativamente diferente do
Português. Em Portugal os Tribunais Administrativos constituem uma jurisdição
autónoma e têm nos três níveis órgãos de natureza jurisdicional. Na Inglaterra
esta especialização funcional da função administrativa só existe na primeira
instância. Assim sendo, podemos caracterizar a estrutura de Civil Courts em Inglaterra do seguinte
modo:
SUPREME COURT --» CIVIL COURT OF
APPEAL --» HIGH COURT OF JUSTICE --» COUNTY COURT
O Administrative
Court é uma instituição relativamente recente em Inglaterra. Este é uma
subdivisão do Queen’s Bench incluído,
juntamente com a Chancery Division e
a Family Division no High Court of Justice. Este é um Civil Court.
O Administrative
Court é um tribunal de segunda instância e, como tal, a sua função é
apreciar a validade das decisões de outros tribunais. Qualquer indivíduo poderá
trazer a este tribunal uma decisão de outro tribunal desde que tenha um
interesse directo na mesma. Será pois um fórum legal onde as decisões oficiais
de outros tribunais são apreciadas quanto à sua validade.
Neste contexto é importante distinguir este sistema
Anglo-Saxónico do sistema Francês.
A distinção entre os modelos Francês e Britânico assenta em
três características, que no início eram radicalmente diferentes e que hoje em
dia, ainda diferentes, são muito mais próximas da realidade hoje em causa. Em
primeiro lugar, existe no sistema Francês um ramo de normas de um direito
privativo da Administração, que pode ser considerado como correspondendo ao
Direito Administrativo. Em segundo, distingue-se a necessidade de apurar se as
autoridades públicas têm poderes de autotutela, ou se, pelo contrário, dependem
dos tribunais para exercer essa execução coactiva (heterotutela). A autotutela
é realizada directamente pela Administração enquanto a heterotutela é realizada
pelos tribunais. Por último, encontramos a diferença acerca da existência ou
não, nos diferentes países, de tribunais especializados em razão da matéria
administrativa. Poderá haver unidade, onde existe apenas uma jurisdição que
resolve todos os litígios, ou dualidade de jurisdições, onde existem duas ou
mais jurisdições encarregadas de resolver todos os litígios.
O Prof. Freitas do Amaral, ao tratar a matéria das
características da Organização Administrativa afirma que ou há uma organização
administrativa concentrada e centralizada, que assenta numa pessoa colectiva
Estado sendo que, neste quadro, os poderes são exercidos de forma concentrada,
ou seja, é o Governo que toma a maioria das decisões, ou, pelo contrário, há
uma organização administrativa descentralizada e desconcentrada, que
corresponde a várias pessoas colectivas e a vários centros de poder dentro de
cada uma das pessoas colectivas. Tal corresponderá à dicotomia entre estes
sistemas. Esquematizando:
Sistema Britânico:
· Descentralizado
· Entrega o controlo jurisdicional aos tribunais comuns
· Direito comum regula a Administração (Direito privado)
· Decisões administrativas dependem da sentença do tribunal
· Administração é subordinada aos tribunais comuns
Sistema Francês:
·
Centralizado
·
Entrega controlo jurisdicional aos tribunais administrativos
·
Direito administrativo regula a Administração
·
Decisões administrativas dispensam intervenção do tribunal
·
Administração independente do poder judicial.
Curiosamente, a evolução entre os sistemas Anglo-Saxónico e
Francês tem sido num sentido de aproximação. Assim, em Inglaterra têm vindo a
surgir os já referidos Administrative Tribunals e em França aumentaram as
relações entre os particulares e o Estado submetidas à fiscalização dos
tribunais judiciais.
Relativamente ao direito aplicável à Administração, enquanto
em Inglaterra, dada a transição para o Estado social de Direito, começaram a
aparecer cada vez mais leis administrativas, em França, a Administração passou
a actuar sob o domínio do Direito Privado em várias situações. Quanto à
execução das decisões da Administração, em Inglaterra, passaram a ser
obrigatórias para os particulares as decisões dos Administrative Tribunals e, em França, passou a ser possível os
particulares obterem a suspensão da eficácia de decisões unilaterais da
Administração Pública. Deste modo, como afirmou Hauriou, podemos concluir que
estes dois sistemas são distintos mas são também duas espécies do mesmo género
pois ambas são democracias pluralistas de tipo ocidental.
Trabalho realizado por:
-Inês Casanova
-Inês Metello
-Maria Ermida
-Mariana Carvalho
-Sebastião Lorena
Trabalho realizado por:
-Inês Casanova
-Inês Metello
-Maria Ermida
-Mariana Carvalho
-Sebastião Lorena
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