sábado, 20 de abril de 2013

NOÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO


Depois da concepção de acto administrativo própria do Estado liberal, enquadrada nos rígidos moldes da administração agressiva, houve um progressivo desenvolvimento da concepção do acto administrativo e da sua caracterização face à administração e, simultaneamente, face aos particulares.
Temos, desde logo, duas grandes linhas de pensamento europeias, com Otto Mayer na Alemanha, e com Maurice Hauriou em França, a chegarem, partindo de lógicas distintas, a concepções bastante aproximadas. Ambas as correntes vêm o acto administrativo como um acto “blindado”, em relação ao qual os particulares nada podem. É, no dizer destes teóricos, o acto administrativo, igual a uma sentença judicial que opera a execução do direito e o define no caso concreto; e, chega mesmo a dispor de privilégios exorbitantes, na definição do direito. Por Mayer e Hauriou, respectivamente. Mas, estas concepções evoluem, e evoluem de tal forma que arrastam atrás de sí o resto da Europa.
De facto, é nos anos 60, e principalmente nos 70 do séc. XX que o acto administrativo deixa de ser a actuação própria da administração, surgindo uma multiplicidade de novas formas da administração realizar o seu fim (concretizar as opções políticas fundamentais definidas pelo poder político).
Esta mudança na forma de ver a administração só se começa a fazer ver em Portugal décadas mais tarde, do ponto de vista legislativo. Sendo que somente em 2004 é que o direito português se vê, finalmente livre das já pré-históricas concepções actocêntricas.
Mas então em que é que ficamos?? – o como é que se caracteriza o acto administrativo hoje em dia. 
Numa tentativa no sentido de dar uma resposta a esta questão que, aparentemente, incomoda bastante a doutrina administrativista, o Código do Procedimento Administrativo surge como uma definição legal. Com efeito, o artigo 120º do mesmo diploma dispõe que: “Para efeitos da presente lei, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”.
Existem duas concepções doutrinárias divergentes do acto administrativo, relativamente à noção de acto administrativo:
Concepção ampla: define acto administrativo como simplesmente produtor de efeitos jurídicos, sendo possível uma distinção entre eles, distinguindo actos recorríveis de actos não recorríveis. Esta concepção corresponde basicamente à orientação francesa, e é a dominante em Portugal.
Concepção restrita: reserva o conceito de acto administrativo apenas para os actos recorríveis, e define-o como produtor de efeitos jurídicos relativamente aos particulares. Esta concepção é a que corresponde à tendência do direito alemão e do direito austríaco, sendo seguida entre nós por Rogério Soares e Sérvulo Correia.
Em Portugal, tradicionalmente, adoptava-se um conceito amplo de acto administrativo, em que se enquadravam os actos recorríveis, tradicionalmente designados definitivos e executórios. Esta ideia é herdada da construção de Marcello Caetano, que é de tal forma ampla que tem capacidade para abarcar regulamentos, actos jurisdicionais e administrativos. Deste acto em sentido amplo se distinguia um outro mais restrito, que correspondia àqueles actos que tinham por conteúdo a fixação autoritária de posições relativas. É este acto em sentido restrito, que é definido de acordo com o modelo autoritário que se denomina de acto definitivo e executório.
Transposta para a realidade portuguesa, a concepção restrita, define o acto administrativo como recorrível, deixando, no entanto, de parte os actos que não são decisórios. O Prof. Rogério Soares, defensor da concepção restrita defendia que os actos administrativos só seriam de impugnação contenciosa caso neles concorressem os requisitos da definitividade e da executoriedade. Isto implica, desde logo, uma divisão de actos administrativos em duas categorias, o que contradiz esta concepção, pois pressupõe-se que há actos administrativos que não são considerados.
Esta posição foi recentemente adoptada pelo Prof. Freitas do Amaral, recorrendo para tal a argumentos literais retirados do artigo 120º do CPA. Este autor afirma que o recurso à palavra “decisões” remete para a ideia de imperatividade própria dos actos definitivos e executórios, ou seja, um conceito estrito de “decisão”. Esta argumentação do Prof. Freitas do Amaral foi facilmente desmontada pelo Prof. Pereira da Silva, que contra argumenta com a afirmação de que a palavra “decisão” não tem necessariamente um sentido judiciário.
Cumpre, também, afirmar que os actos administrativos exigem concretude a individualidade. E que os regulamentos, por via de regra exigem generalidade e abstracção, no entanto a doutrina tende a categorizar, juntamente com os regulamentos, os actos individuais e abstractos, e os actos gerais e concretos.
O Professor Vasco Pereira da Silva defende que o acto administrativo deve ser definido de forma ampla, de forma a que este possa responder à diversidade e complexidade das actuações administrativas da actualidade. Com efeito, o acto administrativo, deve englobar tanto a actividade no domínio da Administração agressiva, como as decisões de natureza prestadora e conformadora. Com efeitos, o surgimento dos actos de prestação veio por em causa o conceito autoritário de acto administrativo que se caracterizava pelas notas restritivas. Desta forma, os actos administrativos não se podem caracterizar pelo seu efeito regulador, nem pela produção individualizada de efeitos relativamente a um concreto particular, nem se podem reconduzir à ideia do privilégio de execução prévia.
De facto, no contexto da concepção ampla interpreto o artigo 120 do CPA da seguinte forma:
 “Para efeitos da presente lei” – sinal de humildade por parte do legislador, que não pretende impor uma definição universal.
“consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração” – deve entender-se por “decisões”, todos os actos que a Administração “decide” que vai adoptar, visando “produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”. “decisão” remete para voluntariedade (conduta voluntária) (motu prorio) por parte da Administração. 
“ao abrigo de normas de direito público” – as normas de direito público têm a função de impor uma interpretação extensiva para “órgãos da Administração”, devendo entender-se como “praticado no exercício do poder administrativo, por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei” – palavras do Prof. Freitas do Amaral.


Rodrigo Lobo Machado, 140111033

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