segunda-feira, 1 de abril de 2013

Princípio da Imparcialidade:uma via(parcial) de prossecução do Interesse Público


A Administração Pública é parcial pois visa prosseguir o interesse público ao mesmo tempo que é imparcial na ponderação dos interesses públicos e privados sobre os quais a sua actuação incide.
«Não é por acaso que a estátua que costuma representar a justiça é uma figura humana que tem na mão uma balança com dois pratos e uma venda nos olhos» que «procura representar a ideia de que a justiça deve ser cega, isto é, não deve determinar-se em função da amizade ou da inimizade para com qualquer das partes» - assim afirma o Professor Diogo Freitas do Amaral no seu Curso de Direito Administrativo.
Esta passagem é muito elucidativa permitindo, facilmente, retratar a posição super partes que o Princípio exige: o terceiro que resolve a questão tem de estar acima e fora dos interesses das partes logo não deve tomar partido de nenhuma das parte para ter autoridade social.
O princípio está relacionado, além da actividade da Administração Pública, com o Direito Processual e com a prática dos Tribunais e, assim sendo, com o Juiz.
Os artigos 266º,nº 2, da Constituição e 6º,do Código de Procedimento Administrativo consagra-o com a finalidade de que a Administração na tomada de decisões deve ter como base critérios objectivos de interesse público não sendo admissível que estes sejam substituídos ou modificados por influência de interesses distintos à sua função específica.
O Professor, na mesma obra, propõe duas vertentes(assim como Marcelo R. De Sousa e ASM):
- Negativa
Os titulares de orgãos e os agentes da AP estão vedados de intervir em qualquer acto que diga respeito a questões do seu interesse pessoal ou da sua família, ou de pessoas com quem tenham relações económicas de especial proximidade, a fim de que não possa se suspeitar da isenção ou rectidão da sua conduta(CPA, artigos 44º a 51º).
Para os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos esta vertente «proíbe a administração de, a propósito de um caso concreto, tomar em consideração e ponderar interesses públicos ou privados que, à luz do fim legal a prosseguir, sejam irrelevantes para a sua decisão.»
O CPA distingue ainda as situações de impedimento e as de suspeição, sendo que as primeiras são mais graves.
No caso de haver impedimento, é imperativo legal a substituição do órgão ou agente normalmente competente por outro, que por ele tomará a decisão.  Já relativamente à suspeição, a substituição não decorre de forma automática mas sendo apenas possível  através de requerimento pelo próprio órgão ou agente,  que pede escusa de participar naquele procedimento, ou pelo particular que opõe uma suspeição àquele órgão ou agente e pede a sua substituição por outro.
O nº1 do artigo 44º do diploma já referido trata da enumeração das situações de impedimento. Assim sendo, qualquer órgão ou agente da AP que se encontre numa destas situações não pode intervir no procedimento administrativo.
A lei impõe sanções para o desrespeito das normas sobre garantias de imparcialidade: anulabilidade(de todos os actos administrativos e contratos em que intervenha um órgão ou agente impedido de intervir, ou em relação ao qual tenha sido declarada suspeição) – art 51º nº1, CPA.
Também pode cominar falta disciplinar grave a hipótese de omissão da situação de impedimento por parte de um órgão ou agente(51º nº 2).
O artigo 8º nº2 da Lei nº27/96, de 1 de Agosto impõe a perda de mandato(a órgãos autárquicos) caso sejam violadas as garantias de imparcialidade previstas na lei.
Para os restantes membros da AP nem a lei nem o CPA establecem qualquer sanção(membros do Governo, por exemplo). Pode-se admitir que haja aqui uma lacuna segundo o Professor Freitas do Amaral.
- Positiva
Como o dever, por parte da AP, de ponderar quer «todos os interesses públicos secundários e os interesses privados legítimos, equacionáveis para o efeito de certa decisão, antes da sua adopção»(Professor D.Freitas do Amaral). Consideram-se assim parciais os actos que, manifestamente, não resultem de uma ponderação a fundo dos interesses em jogo.
Na eventualidade da prática de actos sem a ponderação de interesses a anulabilidade é a sanção para o vício- o juiz administrativo pode anular tais comportamentos.
A meu ver, podem ser apostas críticas a ambas as vertentes. No tocante à negativa,  a natureza humana pode levar a que formalmente não seja violado o Princípio mas que, por influência obscuras “nos bastidores”, de facto o órgão ou agente administrativo que não devia participar no acto acaba por moldar a decisão de acordo com os seus critérios. Veja-se o caso de um Ministro não poder contratar um ex-colega de faculdade por razões de intimidade ou proximidade. Se porventura, o Secretário de Estado do mesmo Ministério tiver competências para tal ou isso seja possível através de delegação de poderes(artigo 35º e seguintes do CPA), a decisão pode “no papel” ser do Secretário mas na prática foi o Ministro que lhe indicou qual a decisão a tomar.Todavia, tal seria uma fraude à lei. É inquestionável que tal sucede principalmente na actividade política só que as vantagens atingidas pelo Princípio superam as desvantagens: o interesse público e a transparência, se não totalmente, parcialmente são prosseguidos.
A vertente positiva tem que ser cuidadosamente  conciliada com o Princípio da Desburocratização(artigo 10º do mesmo diploma legal). É inegável a sua adequação(vertente positiva) ao sistema principalmente para satisfazer o interesse público, no entanto exigindo-se  celeridade( art. 57º CPA) não se pode pender mais para um princípio ou para outro, mas é preciso, um procedimento proporcional na adequada medida dos dois princípios. A celeridade sem mais pode levar a decisões precipitadas e não ponderadas, é lesado o interesse público. A ponderação excessiva pode constituir um entrave à actividade administrativa. Cabe  referir que o Princípio tem que ser conciliável com a Proporcionalidade que é critério de ponderação na vertente positiva. Por outro lado, pode ser muito difícil a prova da sua violação em ambas as vertentes.
Discute-se ainda se o Princípio da Imparcialidade é corolário do Princípio da Justiça. O Professor Freitas do Amaral afirma que antes consiste na protecção da confiança dos cidadãos na seriedade e honestidade da AP. «Independentemente de as decisões da Administração serem justas ou não, a lei pretende que os cidadãos possam ter sempre confiança na capacidade de a Administração tomar decisões justas»
Claro que também se exige em justiça, mas a confiança está neste caso em primeira linha, já que a Justiça é mais visada, especialmente, noutros Princípios.



Bibliografia:

-Amaral, Diogo Freitas do - «Curso de Direito Administrativo», volume II, 2ª edição, Almedina, 2011
-Sousa, Marcelo Rebelo de/Matos, André Salgado de - «Direito Administrativo Geral - Introdução e princípios fundamentais», Tomo I, 3ª edição, Dom Quixote, 2008 

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