A Administração Pública é parcial pois visa prosseguir o
interesse público ao mesmo tempo que é imparcial
na ponderação dos interesses públicos e privados sobre os quais a sua actuação
incide.
«Não é por acaso que a estátua que costuma representar a
justiça é uma figura humana que tem na mão uma balança com dois pratos e uma
venda nos olhos» que «procura representar a ideia de que a justiça deve ser
cega, isto é, não deve determinar-se em função da amizade ou da inimizade para
com qualquer das partes» - assim afirma o Professor Diogo Freitas do Amaral no
seu Curso de Direito Administrativo.
Esta passagem é muito elucidativa permitindo, facilmente,
retratar a posição super partes que o
Princípio exige: o terceiro que resolve a questão tem de estar acima e fora dos
interesses das partes logo não deve tomar partido de nenhuma das parte para ter
autoridade social.
O princípio está relacionado, além da actividade da
Administração Pública, com o Direito Processual e com a prática dos Tribunais e,
assim sendo, com o Juiz.
Os artigos 266º,nº 2, da Constituição e 6º,do Código de
Procedimento Administrativo consagra-o com a finalidade de que a Administração
na tomada de decisões deve ter como base critérios objectivos de interesse
público não sendo admissível que estes sejam substituídos ou modificados por
influência de interesses distintos à sua função específica.
O Professor, na mesma obra, propõe duas vertentes(assim como
Marcelo R. De Sousa e ASM):
- Negativa
Os titulares de orgãos e os agentes da AP estão vedados de intervir
em qualquer acto que diga respeito a questões do seu interesse pessoal ou da
sua família, ou de pessoas com quem tenham relações económicas de especial
proximidade, a fim de que não possa se suspeitar da isenção ou rectidão da
sua conduta(CPA, artigos 44º a 51º).
Para os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado
de Matos esta vertente «proíbe a administração de, a propósito de um caso
concreto, tomar em consideração e ponderar interesses públicos ou privados que,
à luz do fim legal a prosseguir, sejam irrelevantes para a sua decisão.»
O CPA distingue ainda as situações de impedimento e as de
suspeição, sendo que as primeiras são mais graves.
No caso de haver impedimento, é imperativo legal a
substituição do órgão ou agente normalmente competente por outro, que por ele tomará
a decisão. Já relativamente à suspeição,
a substituição não decorre de forma automática mas sendo apenas possível através de requerimento pelo próprio órgão ou
agente, que pede escusa de participar
naquele procedimento, ou pelo particular que opõe uma suspeição àquele órgão ou
agente e pede a sua substituição por outro.
O nº1 do artigo 44º do diploma já referido trata da
enumeração das situações de impedimento. Assim sendo, qualquer órgão ou agente
da AP que se encontre numa destas situações não pode intervir no procedimento
administrativo.
A lei impõe sanções para o desrespeito das normas sobre
garantias de imparcialidade: anulabilidade(de
todos os actos administrativos e contratos em que intervenha um órgão ou agente
impedido de intervir, ou em relação ao qual tenha sido declarada suspeição) –
art 51º nº1, CPA.
Também pode cominar falta
disciplinar grave a hipótese de omissão da situação de impedimento por
parte de um órgão ou agente(51º nº 2).
O artigo 8º nº2 da Lei nº27/96, de 1 de Agosto impõe a perda de mandato(a órgãos autárquicos)
caso sejam violadas as garantias de imparcialidade previstas na lei.
Para os restantes membros da AP nem a lei nem o CPA
establecem qualquer sanção(membros do Governo, por exemplo). Pode-se admitir que
haja aqui uma lacuna segundo o Professor Freitas do Amaral.
- Positiva
Como o dever, por parte da AP, de ponderar quer «todos os
interesses públicos secundários e os interesses privados legítimos,
equacionáveis para o efeito de certa decisão, antes da sua adopção»(Professor D.Freitas
do Amaral). Consideram-se assim parciais os actos que, manifestamente, não
resultem de uma ponderação a fundo dos interesses em jogo.
Na eventualidade da prática de actos sem a ponderação de
interesses a anulabilidade é a sanção para o vício- o juiz administrativo pode
anular tais comportamentos.
A meu ver, podem ser apostas críticas a ambas as vertentes. No
tocante à negativa, a natureza humana
pode levar a que formalmente não seja violado o Princípio mas que, por
influência obscuras “nos bastidores”, de facto o órgão ou agente administrativo
que não devia participar no acto acaba por moldar a decisão de acordo com os
seus critérios. Veja-se o caso de um Ministro não poder contratar um ex-colega
de faculdade por razões de intimidade ou proximidade. Se porventura, o Secretário
de Estado do mesmo Ministério tiver competências para tal ou isso seja possível
através de delegação de poderes(artigo 35º e seguintes do CPA), a decisão pode “no
papel” ser do Secretário mas na prática foi o Ministro que lhe indicou qual a
decisão a tomar.Todavia, tal seria uma fraude à lei. É inquestionável que tal
sucede principalmente na actividade política só que as vantagens atingidas pelo
Princípio superam as desvantagens: o interesse público e a transparência, se
não totalmente, parcialmente são prosseguidos.
A vertente positiva tem que ser cuidadosamente conciliada com o Princípio da
Desburocratização(artigo 10º do mesmo diploma legal). É inegável a sua
adequação(vertente positiva) ao sistema principalmente para satisfazer o
interesse público, no entanto exigindo-se
celeridade( art. 57º CPA) não se pode pender mais para um princípio ou
para outro, mas é preciso, um procedimento proporcional na adequada medida dos
dois princípios. A celeridade sem mais pode levar a decisões precipitadas e não
ponderadas, é lesado o interesse público. A ponderação excessiva pode
constituir um entrave à actividade administrativa. Cabe referir que o Princípio tem que ser
conciliável com a Proporcionalidade que é critério de ponderação na vertente
positiva. Por outro lado, pode ser muito difícil a prova da sua violação em
ambas as vertentes.
Discute-se ainda se o Princípio da Imparcialidade é
corolário do Princípio da Justiça. O Professor Freitas do Amaral afirma que
antes consiste na protecção da confiança dos cidadãos na seriedade e
honestidade da AP. «Independentemente de as decisões da Administração serem
justas ou não, a lei pretende que os cidadãos possam ter sempre confiança na
capacidade de a Administração tomar decisões justas»
Claro que também se exige em justiça, mas a confiança está
neste caso em primeira linha, já que a Justiça é mais visada, especialmente, noutros Princípios.
Bibliografia:
-Amaral, Diogo Freitas do - «Curso de Direito Administrativo», volume II, 2ª edição, Almedina, 2011
-Sousa, Marcelo Rebelo de/Matos, André Salgado de - «Direito Administrativo Geral - Introdução e princípios fundamentais», Tomo I, 3ª edição, Dom Quixote, 2008
Bibliografia:
-Amaral, Diogo Freitas do - «Curso de Direito Administrativo», volume II, 2ª edição, Almedina, 2011
-Sousa, Marcelo Rebelo de/Matos, André Salgado de - «Direito Administrativo Geral - Introdução e princípios fundamentais», Tomo I, 3ª edição, Dom Quixote, 2008
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