A Administração actua com base na lei, adoptando critérios
legais e tomando posteriormente decisões quanto à questão final e última que
determinou a sua actuação. Tudo isto está sujeito a um controlo que será
diferente consoante o poder seja discricionário ou vinculado. Ao contrário do
que se poderia pensar, há sempre vínculos que permitem o controlo da
administração dentro da margem da discricionariedade que lhe é permitida. Tradicionalmente, as duas vinculações que existiam em relação ao poder
discricionário eram a competência (que é sempre vinculada) e o fim legal da sua
actuação. Estes dois vínculos continuam a existir para qualquer actuação da
administração. Contudo, actualmente, há outros que a obrigam, desde logo os
princípios constitucionais.
No universo dos princípios fundamentais encontramos os princípios
da organização e do funcionamento da Administração Pública, como o princípio da
desburocratização, da descentralização, desconcentração, da unidade, entre
outros; e, ainda, os princípios que orientam a própria actuação administrativa,
como o princípio da legalidade, da prossecução do interesse público, da
proporcionalidade, igualdade, boa fé, justiça, etc.
Enquanto vínculos da actuação administrativa no exercício do
seu poder discricionário é sobretudo este segundo grupo que nos interessa,
embora devamos ter sempre em conta que todos os outros se encontram subjacentes
à lógica do funcionamento da Administração Pública como um todo, sendo igualmente interessante conhecê-los e compreendê-los.
Antes de proceder a uma breve exposição de dois dos princípios que obrigam a Administração no exercício dos seus poderes discricionários (nomeadamente, o princípio da proporcionalidade e o princípio da igualdade), parece-me fundamental compreender o que está realmente subjacente a estes conceitos, de uma forma sucinta e apreensível ao senso comum.
Pensando numa receita simples, por exemplo, de uma omelete, o primeiro passo é, naturalmente, ler a receita. Depois de anotar quais os ingredientes necessários, teremos de ver quais os que temos no frigorífico e eventualmente ir à mercearia adquirir os que estão em falta. Sabemos que temos de utilizar 5 ovos, 2 fatias de pão, sal e pimenta (...), e na escolha da qualidade dos ovos que iremos utilizar, se adicionaremos pimenta branca ou preta, ou que tipo de pão queremos cozinhar, estamos a fazer uma escolha, pela qual somos responsáveis. É precisamente neste campo, que implica uma margem de escolha, que se encontra o poder discricionário da entidade administrativa. Esta escolha, naturalmente, tem de ser feita dentro da margem, é controlada, e é neste controlo que se fala nos princípios que obrigam a Administração. Poderemos escolher qual a pimenta que utilizaremos e a quantidade que queremos adicionar; só não podemos exceder aquela quantidade razoável que traça a diferença entre cozinharmos uma omelete saborosa e estragarmos a receita por completo. A diferença entre uma actuação da administração lícita, e uma actuação ilegal.
Pensando numa receita simples, por exemplo, de uma omelete, o primeiro passo é, naturalmente, ler a receita. Depois de anotar quais os ingredientes necessários, teremos de ver quais os que temos no frigorífico e eventualmente ir à mercearia adquirir os que estão em falta. Sabemos que temos de utilizar 5 ovos, 2 fatias de pão, sal e pimenta (...), e na escolha da qualidade dos ovos que iremos utilizar, se adicionaremos pimenta branca ou preta, ou que tipo de pão queremos cozinhar, estamos a fazer uma escolha, pela qual somos responsáveis. É precisamente neste campo, que implica uma margem de escolha, que se encontra o poder discricionário da entidade administrativa. Esta escolha, naturalmente, tem de ser feita dentro da margem, é controlada, e é neste controlo que se fala nos princípios que obrigam a Administração. Poderemos escolher qual a pimenta que utilizaremos e a quantidade que queremos adicionar; só não podemos exceder aquela quantidade razoável que traça a diferença entre cozinharmos uma omelete saborosa e estragarmos a receita por completo. A diferença entre uma actuação da administração lícita, e uma actuação ilegal.
Os
princípios da igualdade e da proporcionalidade estão previstos no artigo
5º do CPA, assim como no artigo 266º/2 CRP. Importa considera-los
separadamente, sem prejuízo de tecer alguns comentários simultaneamente aos
dois.
O princípio da proporcionalidade, com concretizações nos
artigos 18º/2 e 19º/4 da Constituição e 5º do Código do Procedimento
Administrativo, tem de ser entendido em três dimensões:
1.
Adequação, que se traduz na proibição de
condutas administrativas inaptas para a prossecução do fim que concretamente
visam prosseguir;
2.
Necessidade, ou proibição do excesso, que impõe
que entre vários meios de actuação igualmente adequados se escolha o menos
lesivo para os interesses em causa;
3.
Proporcionalidade em sentido estrito, ou
razoabilidade, que impõe que os custos da actuação administrativa não sejam
superiores aos benefícios que se esperam com essa actuação.
Importa referir que nenhuma destas dimensões pode ser
preterida, sob pena se violar o princípio da proporcionalidade. Uma última nota
prende-se com o facto de ainda que o artigo 5º/2 CPA configure este princípio
com um carácter meramente subjectivo, por força do artigo 266º/2 CRP, devemos
entender que ele assume, igualmente, uma dimensão objectiva, valendo para todas
as decisões administrativas.
A vinculação da administração ao princípio da igualdade
decorre, desde logo, do artigo 5º/1 do Código do Procedimento Administrativo e,
a nível da lei fundamental, do artigo 266º/2 e 13º, bem como de outros
perceitos como o 9º h),
47º/2, 50º/1, 55º/2, 58º/2 b) e 59º CRP. Este princípio, entendido de modo
meramente formal, implica o tratamento igualitário de todos os particulares nas
relações administrativas, impedindo que uns sejam privilegiados em detrimento
de outros. Temos, porém, de tomar em atenção uma dimensão mais substancial, de
acordo com a qual se deverão, de facto, tratar de forma igual as situações idênticas
mas, também, tratar de forma diferente as situações que devam ser
diferenciadas.
O princípio da igualdade pode ser entendido como uma
ramificação do princípio da justiça, na medida em que tem o seu cerne no
conceito de Aristóteles de acordo com o qual "a justiça consiste em dar a cada
um aquilo que é seu".
Do exposto se retira que o princípio da igualdade implica
que se tenham em consideração dois momentos distintos: em primeiro lugar, que
se avaliem as situações para concluir se estas devem ou não ser consideradas
substancialmente idênticas; posteriormente, que se assegure um tratamento
dessas situações conforme com a medida da sua semelhança ou (se for o caso)
dissemelhança.
Uma última nota que me parece importante realçar prende-se
com o facto de este princípio dever ser entendido num sentido negativo e num
sentido positivo. O primeiro implica que a administração tenha o dever de não agir
de modo a provocar desigualdades; ao passo que o segundo impõe à administração
o dever de agir no sentido de corrigir ou evitar eventuais desigualdades.
Apesar do esforço jurisprudencial e doutrinal no sentido de
uma melhor concretização deste princípio (pense-se, por exemplo, no Ac. Do STA
de 29 de Abril de 1993, AD nº 385 p. 53 e ss., que integra no conceito de
igualdade a proibição do arbítrio e de discriminação), a verdade é que embora
já não se discuta que este se trata de um dos princípios fundamentais que
enformam a actuação da Administração, a verdade é que este é, ainda, dotado de
uma reduzida operatividade. Isto porque é extremamente difícil demonstrar num
tribunal que duas situações similares foram tratadas de forma diversa, já para
não falar da quase impossibilidade prática de se provar a existência de duas
situações completamente idênticas. O princípio adquire maior relevância quando,
por exemplo, estamos perante discriminações dentro do mesmo contexto procedimental,
como é o caso daquelas que possam ocorrer em relação a dois concorrentes de um
mesmo concurso público.
Igualdade e proporcionalidade constituem, assim, vinculações
autónomas da Administração Pública, que a obrigam no exercício dos seus poderes
discricionários (que implicam uma margem de escolha da responsabilidade da Administração). A violação tanto de um como de outro determina a ilegalidade
das actuações administrativas, enfermando os respectivos actos administrativos
do vício de violação de lei.
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